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por Paiva

Dec 07 • 4 min read

produtividade demais pode virar doença...


o preço emocional de 2 segundos


É estranho dizer isso, mas parece que a gente virou funcionário de um relógio invisível.

Dois segundos a menos respondendo uma DM no Instagram.
Dois segundos a mais no chuveiro tomando banho.
Dois segundos a mais na cama ao acordar.
Dois segundos a mais servindo um café.
Dois segundos distraído e pronto: você vira “ineficiente”.

E, claro, você se culpa. Eu também.

Porque a gente acredita na fantasia moderna de que ser rápido = ser bom?

E que tudo que escapa dessa lógica é falha de caráter? É pecado respirar fora do ritmo?

Comecei o mês entendendo que a eficiência tinha virado vício e que eu era o único que ainda chamava isso de disciplina.

quando o algoritmo vira seu professor


Não é de hoje que viramos uma geração que mede presença em latência, amizade em tempo de resposta, criatividade em produtividade.

Juro que não é drama.

Porque no meio do turno, cercado de vapor e pedidos entrando, eu percebi uma coisa:

"Eu virei exatamente o tipo de pessoa que sempre fui, mas que passei anos tentando esconder."

Eu repetia a narrativa de que era um profissional “estratégico”, que minha cabeça funcionava melhor no macro, que meu trabalho era pensar, não executar.

Tudo máscara das minhas inseguranças. Típico de garoto começando a carreira.

Sem perceber (silenciosamente), tudo que eu fazia (tudo mesmo) era buscar a forma mais eficiente de o mundo funcionar.

Eu achava que eficiência era mecanismo. Hoje descobri que era identidade.

e talvez você seja assim também


Dezembro virou minha pequena experiência científica.

Os turnos inverteram entre as lojas que trabalho.

Dope Bakehouse virou rodapé. Nemesis virou palco.

E BamBam (loja ainda para abrir e para a qual fui contratado) virou essa criatura mítica no horizonte.

3 a 5 vezes mais movimento, segundo o CEO e o meu Gerente Geral.

Levemente assustador. Levemente sensacional-estou-super-animado.

E isso tudo mexeu comigo de um jeito difícil de explicar, mas vou tentar.

Quando seu mês muda de loja, de ritmo e de dinâmica, você descobre que produtividade demais é como café forte demais.

Parece que vai ajudar, mas só deixa seu corpo tremendo pelas razões erradas.

E foi aí que o turno no Nemesis me deu um tapa metafórico.

o ambiente sempre te expõe antes

Primeiro rage bait suave do dia:

o ambiente sempre revela quem você é, mesmo quando você insiste em não perceber.

O tráfego de pedestres em volta do Nemesis da Polygon Gallery é intenso.

A energia é diferente.
A comida sai rápido, entra rápido, volta rápido.
O brunch é mais extenso.
O bar é mais técnico.
O time é mais experiente.

E qualquer atraso vira efeito borboleta.

É o lugar perfeito pra alguém obcecado por eficiência... ou o lugar perfeito para perceber que eficiência sem presença é só um tipo discreto de exaustão.

E no meio desse caos bonito, entendendo estoques, cortes de custo, revezamento de staff, percebi algo quase filosófico:

O algoritmo não só nos influencia. Ele nos educa.

Ele decide o tráfego de pedestres.

Decide o que está “trendy”, na moda.

Decide quem tem espaço na agenda.

Decide quem fica na operação e quem vira custo.

E a gente...só segue.

Mas o mais estranho é notar como, hoje, uma loja física respira no ritmo da internet.

Se a página aparece mais no feed, o balcão enche.
Se desaparece por uma semana, o salão esvazia.

E você sente isso na pele, no bar ficando mais rápido, no turno ficando mais longo, no corpo entendendo antes da cabeça que a atenção mudou de lugar.

o caminho difícil é mais humano


Sempre.

No meio da confusão do feriado de Remembrance Day, um turno que parecia vídeo acelerado no TikTok, eu entendi o que não via com tanta nitidez:

Não existe operação impecável sem hospitalidade eficiente.

Em 3-4 meses, além das técnicas de café, eu aprendi:

  • Calibração emocional: Ler o clima do cliente em segundos e ajustar sua energia.
  • Hospitalidade calma: Ser acolhedor sem exagero; presença sem performance.
  • Velocidade com compostura: Mover rápido sem parecer apressado ou caótico.
  • Consciência sensorial: Perceber sabor, cor e som do café com precisão.
  • Micro-comunicação: Pequenos sinais que mantêm o fluxo entre equipe e clientes.
  • Desarme de conflitos: Resolver atritos sem confronto e sem elevar o tom.
  • Psicologia da fila: Controlar a sensação de espera e o ritmo do atendimento.
  • Ritmo de equipe: Entrar na coreografia do time sem atrapalhar.
  • Orgulho sem ego: Cuidar do café com excelência, sem arrogância.
  • Confiabilidade: Ser consistente, pontual e alguém em quem o time todo confia.

Nada disso aparece nos dashboards de gestão. Não cabem em KPI. Não obedecem algoritmo. E, paradoxalmente, são as habilidades que mantêm tudo vivo e em movimento.

Foi ali que percebi: eu não estou aprendendo só sobre café. Estou aprendendo sobre cuidar.

o lugar que ainda não existe


mas já ensaia o próprio fôlego.

No meu dia off, enquanto escrevo percebo que existe um espaço que ainda não abri, mas que já me habita.

Um lugar onde eficiência não desaparece. Ela só perde o direito de mandar no clima.

Imagino um balcão que aceita ritmo humano.
Um café onde a pressa não é moeda.
Um canto onde a tecnologia ajuda, mas não sequestra.
Onde o algoritmo não decide o humor do dia, nem o valor do seu tempo.

Um lugar em que segundos contam, claro…
mas não contam tudo.

Talvez seja ingênuo.
Talvez seja só o corpo pedindo um tipo diferente de futuro.
Um futuro menos medido, mais sentido.
Mais manual, mais presente, mais nosso.

Se você leu até aqui, me conta respondendo a esse email:

Qual foi o momento mais inesquecível que você já viveu num coffee shop ou restaurante, e o que exatamente tornou aquele momento impossível de esquecer?


Todo mundo guarda um momento marcante num café ou restaurante.

Qual é o seu?

Esse e-mail termina aqui.
O resto, é seu.

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