você pula de galho em galho? trab, projetos, desejos...
plantando uma semente
Minha mãe me ligou essa semana e me fez uma pergunta simples, mas com... peso. Foi nossa ligação de sempre, com aquele intervalo que mistura saudade e curiosidade. No meio da conversa, ela perguntou:
“Tá… mas como é que você tá, filho?”
Respondi rápido: “tô bem”. Mas foi um “tô bem” medido. Economizado, como quem segura o café pra ele não esfriar antes da hora. Não era mentira. Eu realmente estava bem. Mas num tipo de bem que não cabe em euforia. Foi um "bem" silencioso, de quem acabou de plantar a primeira semente e agora precisa lembrar o próprio corpo de esperar o suficiente pra ver ela brotar.
Sem euforia demais. sem expectativa demais.
você pula de galho em galho?
E então, no caminho de manhã pra cafeteria, fiquei pensando numa história que li sobre o comediante Mitch Hedberg. Ele passou anos tentando se tornar um comediante de destaque. Quando finalmente conseguiu, começaram a pedir que ele fizesse outras coisas: filmes, roteiros, programas de TV. E ele respondeu algo como:
“Trabalhei duro pra virar um bom cozinheiro, e agora me perguntam se sei plantar.”
Essa frase me persegue porque parece ter sido escrita para o tempo em que a gente vive. Pra essa era em que o Instagram premia quem se divide, enquanto a vida real continua premiando quem fica. Tem algo de contra-cultural em escolher permanecer. Em aprender uma coisa até ela mudar você. Ryan Holiday fala muito sobre isso. Sobre não interromper o próprio efeito cumulativo. Mas quando ele fala de “plantar sementes”, o que ele realmente diz é: a colheita de amanhã é consequência das repetições invisíveis de hoje. E essa talvez seja a parte mais difícil de aceitar pra quem cresceu cercado por notificações: O trabalho de verdade é o que não tem resultado imediato.
começar vs progredir
Essa semana, na cafeteria, um garoto de 25 anos me ensinou sobre o ponto certo da extração do espresso, sobre hospitalidade, sobre operação de cafeteria. Como é que pode, né? Um garoto 10 anos mais novo ensinando um cara 10 anos mais velho, como se tivesse 10 anos de experiência. Eu ouvi com atenção, como se fosse uma aula sobre física quântica. E pensei: já estive no lugar dele. Já achei que dominar o próximo atalho era o mesmo que entender o caminho. E isso me deixou tranquilo. A internet nos ensinou a confundir começo com progresso. Mas café, por exemplo, não deixa. Se você tenta apressar, amarga. E é isso que mais me fascina nessa nova fase. O ritmo das coisas que não dá pra acelerar, nem adiar. A máquina precisa aquecer. O leite precisa expandir no tempo certo. O cliente precisa terminar de falar antes que o próximo seja atendido. Aui, a pressa não tem lugar .
geração da pressa e do incapaz?
Eu olho pra minha geração e vejo o quanto a gente foi moldado pra pular de ideia em ideia, de profissão em profissão, de propósito em propósito, como se errar fosse sinal de incapacidade. Como se o erro fosse ficar tempo demais em um só lugar. Já ouviu aquele ditado "Errar uma vez, ok. Insistir no erro, é burrice"? Mas e se o erro for justamente o contrário? E se o que falta não for mais velocidade tampouco capacidade imediata, mas mais permanência? Mais insistência? Mais paciência? O Instagram e o TikTok nos convenceram de que pensar devagar é perder. Mas talvez seja o único jeito de não se perder. Quando desliguei o telefone com a minha mãe, pensei de novo no “tô bem”. Era verdade. Só que um tipo de bem que não cabe em post, nem em Reels, nem em algoritmo. Um "tô bem" que vem de estar amarrado ao real. De acordar cedo, abrir a loja, ajustar a moagem, limpar o balcão, ouvir o barulho da rua. Porque talvez o trabalho que realmente importa, aquele que ninguém pode ver, seja justamente o que o algoritmo não consegue entender. E esse trabalho é o que, um dia, faz tudo florescer. Esse e-mail termina aqui. O resto, é seu.